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O aprendizado e a constituição identitária

Acabei de ter mais uma aula de francês. Como tenho muita dificuldade na pronúncia do R, estava pensando nas dificuldades de aprendizagem em relação a constituição identitária. No meu caso, analisando minha história pessoal, é possível entender o porquê desta dificuldade, que não se trata apenas de um desconhecimento do fonema, mas algo que está diretamente ligado a um trauma infantil com a pronuncia deste mesmo R. Sem entrar em grandes detalhes em relação a essa história, penso também em histórias de outras pessoas (adultos e crianças) e suas diversas dificuldades no aprendizado de línguas e/ou de conteúdos diversos (matemática, história, etc).

(Vale lembrar que no Podcast sobre Ensino de Língua Inglesa – que tem duas partes, eu a Prof. Dilma falamos um pouco sobre a questão identitária e como ela interfere no aprendizado de línguas. E hoje quero escrever um pouco mais sobre o assunto, porque acredito que a questão da identidade está ligada a qualquer aprendizado, suas possibilidades e seus limites).

Quando vejo uma criança com dificuldades na escola, em qualquer matéria, tento entender de que forma a dificuldade pode ser não só de conteúdo, mas de algo que não é “visível”, ou seja, uma dificuldade prática que é reflexo de um dificuldade psíquica, ligada à questões de construção identitária mesmo. Faço o convite a essa reflexão: que cada um de vocês pense sobre uma dificuldade especifica no aprendizado de qualquer coisa, e como isso pode estar ligado a questões internas, traumas, dificuldades emocionais, etc. Não é tão fácil perceber essas ligações quanto se imagina. Porque não necessariamente elas acontecem no nível consciente. Mas continuem ai pensando…

Para a Psicologia, falar em identidade é falar da noção de sujeito. Segundo Lacan (1966) “o desejo do homem encontra seu sentido no desejo do outro, não tanto porque o outro detém as chaves do objeto desejado, mas porque seu primeiro objeto (do desejo do homem) é de ser reconhecido pelo outro”. O sujeito, ou a identidade, são então construídos através de oposições, conflitos e negociações, permanentemente inventadas por estes sujeitos em um processo aberto, inacabado. A identidade aqui é compreendida com uma construção, fundamentada numa concepção de sujeito caracterizado pela fragmentação. Ao contrário de perspectivas que apontam o homem como um sujeito racional (movido fundamentalmente pela razão) ou como um ser produto do social (determinado pela sua origem sócio histórica), a identidade do sujeito pós-moderno pode ser caracterizada pela fragmentação: suas características, atitudes e valores são situados em contextos singulares.

Assim, não dá pra pensar uma disciplina ou uma linguagem sem pensar no sujeito que está ali aprendendo. A idéia e criar um o objetivo olhando os sujeitos envolvidos, porque todo processo de aprendizagem provém de alguém que tem suas marcas identitárias específicas que o localizam na vida social e que o posicionam nas situações de aprendizagem de um modo singular assim como seus interlocutores.

A construção da identidade, para a psicanálise, é um processo que passa pela língua, que, representando para o sujeito a dimensão simbólica, cria a possibilidade de que haja identificação. Ao falarmos de identidade e sujeito, falamos, portanto, de língua e de sujeitos, já que entramos no espaço do simbólico, de uma mediação simbólica que permite a produção-compreensão de uma língua. Essa imersão no simbólico que possibilita ao sujeito colocar-se na língua. (leia mais aqui)

Portanto, supor que as dificuldades de um sujeito em relação a um disciplina ou língua está situada somente no consciente, no lado racional e prático é ignorar toda uma série de relações que influenciam aquele sujeito e sua história.

Deixo vocês com essas reflexões, e trago alguns vídeos do Café Filosófico, com o programa tema “O que forma o sujeito hoje?. São vários vídeos, mas vale a pena refletir um pouco sobre essas questões.

Vídeo 01
Vídeo 02
Os outros vídeos estão aqui:

Você sabe o que é baixa visão?

(Vídeo 01: O que é baixa visão)

Além de uma limitação perceptiva, os deficientes visuais são caracterizados por uma ausência de visão, total ou parcial, que influencia diretamente no modo como apreendem as informações do mundo externo.

Na medicina, um deficiente é caracterizado pelo que pode ou não ver e o quanto isto pode ser medido. Assim, para saber se uma pessoa á deficiente visual, sua capacidade visual é medida pela acuidade visual, ou seja, como o grau de aptidão do olho para discriminar os detalhes espaciais (Rocha e Ribeiro-Goncalves, 1987).

Entre um grupo de deficientes visuais, ainda ocorrem subdivisões de tipos de deficientes, de acordo com as limitações que apresentam, e também no quanto de acuidade visual possuem. Há os cegos (ausência total de visão) e aqueles com baixa visão, ou visão subnormal (ainda possuem algum tipo de visão residual).

Segundo Torres & Corn (1990) visão subnormal, ou baixa visão é uma perda severa de visão que não pode ser corrigida por tratamento clínico ou cirúrgico nem com óculos convencionais. Também pode ser descrita como qualquer grau de enfraquecimento visual que cause incapacidade funcional e diminua o desempenho visual. No entanto, a capacidade funcional não está relacionada apenas aos fatores visuais, mas também às reações da pessoa à perda visual e aos fatores ambientais que interferem no desempenho. Muitas funções visuais podem estar comprometidas no indivíduo com visão subnormal, como: acuidade visual, campo visual, adaptação à luz e ao escuro e percepção de cores, dependendo do tipo de patologia apresentada, isto é, do tipo de estrutura ocular que apresenta lesão. Essa condição, no entanto, não deveria ser confundida com cegueira. Pessoas com visão subnormal ainda têm visão útil a qual pode ser melhorada com recursos ópticos especiais. A deficiência visual pode ser menor ou maior dependendo da patologia ou lesão ocular de cada indivíduo.

Para determinar melhor essa divisão, existe uma classificação feita por médicos e oftalmologistas, segundo a qual cegos são aqueles que apresentam acuidade visual de 0 a 20/200 (enxergam a 20 pés de distancia aquilo que uma pessoa normal enxerga a 200 pés), no melhor olho após correção com ajuda de óculos, ou que tenham no máximo um ângulo visual de 20º de amplitude. São considerados indivíduos com visão subnormal aqueles que apresentem acuidade visual de 20/200 pés a 20/70 pés no melhor olho, após correção máxima. (Amiralian, 1997)

O grupo de cegos é formado por aqueles que apresentam desde a ausência total de visão, até a perda de percepção de luz. O grupo de baixa visão é formado por pessoas que teriam desde a condição de indicar a projeção de luz, até o grau em que a redução de visão chega a limitar seu desempenho. (Amarilian, 1986) Ainda segundo esta autora, uma classificação de acordo com a idade também é importante, pois o valor da interação visual nos primeiros anos de vida, não só para formação de conceitos, como de espaço, mas também o estabelecimento das relações afetivas.

As crianças que já nascem com baixa visão têm suas formas próprias de apreender a realidade a sua volta. A grande questão que se coloca para elas é como são vistas pelos outros ao seu redor. Ora são tratadas como cegas, ora são tratadas como se tivessem uma visão normal. (Amiralian, 2004). Muitos pais parecem só conseguir assimilar a realidade de quem enxerga ou de quem é cego, não entendendo que existe outra realidade entre elas. Assim, a atitude materna pode oscilar entre tratar o filho como cego e tratar o filho como uma pessoa que enxerga. Essa situação pode gerar dificuldades emocionais e angústia tanto para os pais quanto para a criança.

Segundo Amiralian (2004), essas dificuldades passadas pelo pelos pais em entender a realidade dos filhos podem levar ao conformismo, ao desinteresse, ao desânimo, ou a uma necessidade de luta pelo filho. Sabe-se o que é enxergar ou não enxergar, mas é muito difícil compreender limitações que variam não só em relação à acuidade visual, mas, também, em relação ao campo visual, à sensibilidade aos contrastes, à adaptação à luz e ao escuro, à percepção de cores e principalmente, à eficácia no uso da visão. A ausência de identificação das crianças que possuem baixa visão constitui-se como um problema nuclear, o que já foi demonstrado por diferentes pesquisas… (Amiralian, 2004)

Por isso, na fase inicial na vida da criança com baixa visão, é de extrema importância a forma como ela se relaciona e se constitui como sujeito. Segundo Amiralian (2004), no estágio inicial de desenvolvimento, a interação com a mãe é considerada primordial, sendo as qualidades dessa interação, e os cuidados fornecidos, elementos essenciais.

Que mãe é essa que consegue ou não sustentar essa posição para seu filho? Amiralian (1997, p.59) comenta que muitos estudos psicanalíticos sobre o desenvolvimento de um bebê deficiente visual mostram as dificuldades principalmente do contato mãe – bebê, no qual estas, ao invés do orgulho natural de conceber, sentem injustiça, orgulho ferido, culpa, depressão, entre outros. Tudo isso, muitas vezes de forma inconsciente, as afasta de seus filhos e, como resultado, o bebê reage a este afastamento com passividade. Segundo Hoffmann (2000), ocorre entre os pais uma espécie de anestesia da função que deveria exercer, e por isso elas acabam restritas somente aos cuidados fisiológicos (…), enceguecidos, os pais não conseguem ver para além dos olhos que não lhes respondem da forma que desejavam. (Hoffmann, 2000).

(Vídeo 2: Como você pode adaptar a escola; como uma pessoa com baixa visão vê)

(Vídeo 3: Adaptações e Recursos)

Saiba mais:

Laramara

Fundação Dorina Nowill

CNIC Canadá

Loja CNIB

Indicações da semana

O assunto da semana passada foi o twitcam, e os dois adolescentes que protagonizaram cenas de sexo ao vivo, para mais de 24 mil pessoas. Indico a leitura do texto do @doni, que fala muito bem sobre o caso, e como a nossa sociedade influencia esse tipo de comportamento.

“Não fico chocado ou indignado, não fico preocupado com nossas futuras gerações por culpa do que estes dois fizeram. Ainda que eu entenda a indignação, a exploração por parte da mídia e a mobilização de setores pedindo mais controle da internet (para variar), minha preocupação real é com este discurso que chama a todos para esta exposição selvagem que acaba nos privando da própria subjetividade. Precisamos fazer uma escolha: devemos ser sujeitos de nosso lugar no mundo ou avatares, moedas a serem exploradas em seu potencial de troca, de produto? Quando decidirmos isso, as crianças e adolescentes entenderão a mensagem.” Leia mais aqui.

Outra indicação é o vídeo do vloger Denis Lee, sobre o sistema educacional contemporâneo. Muito bom!

Ainda sobre a formação e instituições psicanalíticas

Para ler o texto inteiro, clique aqui.

Sobre a Psicanálise e os Conselhos de Fiscalização Profissional

Considerando o surgimento recente de cursos que prometem formar “psicanalistas clínicos”, expedir diplomas de “bacharel em psicanálise” e proceder inscrição dos egressos em “Conselho Regional de Psicanálise”, temos a informar o que se segue:

A Psicanálise é uma teoria a respeito da personalidade humana que incorpora um conjunto de métodos destinado tanto à produção do conhecimento a respeito da personalidade, quanto à intervenção clínica com vista à cura de distúrbios. Enquanto corpo teórico, com seus pressupostos e explicações, tem sido divulgada e utilizada para fundamentar análises em várias áreas da atividade humana, como na interpretação da simbologia de textos literários. Enquanto instrumento de compreensão e intervenção clínica, constitui-se uma opção, dentre outras, para o diagnóstico e a assistência psicoterapêutica.

(…)

A psicanálise, por ser uma abordagem teórica e metodológica que, enquanto instrumento de assistência clínica psicológica, é utilizada em profissões já regulamentadas, não se constitui nem deve se constituir profissão independente.

A aprendizagem dessa abordagem, por parte dos psicólogos, se dá inicialmente no curso de graduação, em disciplinas específicas, e tem sido complementada em cursos de pós graduação oferecidos pelas entidades e grupos que congregam especialistas. Essas entidades e grupos possuem critérios e procedimentos próprios para a formação plena do profissional, que em regra incluem três atividades indissociáveis, os cursos teóricos, a supervisão de casos e a análise pessoal.

Portanto, não existe no mundo jurídico o título de bacharel em psicanálise, a profissão de psicanalista e muito menos a de psicanalista clínico. Qualquer curso, em nível de graduação, que prometa a formação de profissionais com essa denominação, está fazendo propaganda enganosa e, portanto, lesando o consumidor, o que poderá constituir nas infrações previstras nos arts. 7o, VII e 66, 67, da Lei nº 8.137/90 (Código do Consumidor).

(…)

Sendo assim, um curso de psicanálise jamais poderia gerar o direito a diploma de “Bacharel em Psicanálise”, nem tampouco, o título de “Psicanalista Clínico”. E é também ilegal a criação do “Conselho Regional Psicanalítico” ou “Conselho Federal Psicanalítico” por via cartorial.

(…)

Não fosse suficiente, à toda evidência, sequer seria possível a criação da “profissão de Psicanalista ou Psicanalista Clínico”, ainda que ultrapassado o processo legiferante federal, uma profissão não pode ser criada a partir dos recursos utilizados pelos profissionais de saúde mental para o exercício de suas atividades. Ou seja, a Psicanálise, assim como a Gestalt, o Behaviorismo, a Fenomenologia, a Psicologia Analítica e muitas outras abordagens teóricas são instrumentos de intervenção dos profissionais, não fazendo qualquer sentido serem tratadas como objeto específico que justifique a criação de uma profissão.

Entidades Psicanalíticas

De tempos em tempos surge alguém aqui no blog me perguntando sobre a fidedignidade de algumas instituições que oferecem a formação em Psicanálise. Tudo começou quando fiz um texto, em 2008, sobre a SPOB.

Na medida do possível, busco responder fazendo pesquisas sobre a instituição e das pessoas ligadas a ela. Mas é claro que é sempre uma análise restrita, uma vez que nunca é possível saber tudo sobre pessoas e lugares.

Por isso, disponibilizo aqui uma lista das grandes entidades psicanalíticas, que ficou pública em 2004 (quando entramos com um pedido de cancelamento do projeto de lei que tratava da regulamentação da profissão do psicanalista). A lista nunca é completa, mas pode dar uma base e orientação pra quem busca uma instituição e não sabe por onde começar.

(Para ler o manifesto, clique aqui)

Associação Brasileira de Psicanálise
Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo
Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro
Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro
Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre
Sociedade Psicanalítica do Recife
Sociedade Psicanalítica de Pelotas
Sociedade de Psicanálise de Brasília
Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre
Grupo de Estudos Psicanalíticos de Ribeirão Preto
Grupo de Estudos Psicanalíticos de Mato Grosso do Sul
Núcleo Psicanalítico de Belo Horizonte
Núcleo Psicanalítico de Marilia e Região
Núcleo Psicanalítico de Natal
Núcleo Psicanalítico de Fortaleza
Núcleo Psicanalítico de Maceió
Núcleo Psicanalítico de Vitória
Círculo Brasileiro de Psicanálise
Círculo Psicanalítico da Bahia
Círculo Psicanalítico de Pernambuco
Círculo Psicanalítico do Rio Grande do Sul
Círculo Psicanalítico de Sergipe
Círculo Psicanalítico de Minas Gerais
Círculo Brasileiro de Psicanálise – Seção Rio de Janeiro
Grupo de Estudos Psicanalíticos – MG
Instituto de Estudos Psicanalíticos – MG
Sociedade Psicanalítica da Paraíba.
Departamento Formação em Psicanálise,Instituto Sedes Sapientiae-SP
Departamento de Psicanálise, Instituto Sedes Sapientiae-SP
Departamento de Psicanálise da Criança, Instituto Sedes Sapientiae-SP
Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro
Sociedade de Psicanálise da Cidade do Rio de Janeiro
Escola Brasileira de Psicanálise – Escola do Campo Freudiano
Escola de Psicanálise Letra Freudiana
Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle
Corpo Freudiano do Rio de Janeiro – Escola de Psicanálise
Práxis Lacaniana / Formação em Escola
Laço Analítico Escola de Psicanálise (Rio-RJ/Varginha-MG/Cuiabá – MT)
Associação Fóruns do Campo Lacaniano
Escola Lacaniana de Psicanálise – RJ
Escola Lacaniana de Psicanálise de Brasília
Escola Lacaniana de Psicanálise de Vitória
Percurso Psicanalítico de Brasília
Intersecção Psicanalítica do Brasil
Associação de Psicanálise de Brasília
Movimento Psicanalítico D’Escola (ES)
Traço Freudiano Veredas Lacanianas (PE)
Maiêutica Florianópolis – Instituição Psicanalítica
Centro de Estudos Freudianos do Recife
Reuniões Psicanalíticas (SP)
Associação Psicanalítica de Curitiba
Formação Freudiana – RJ
Aleph Psicanálise Transmissão
Espaço Moebius Psicanálise – BA
Escola Lacaniana da Bahia
Formações Clínicas do Campo Lacaniano-RJ
Formações Clínicas do Campo Lacaniano-SP
Escola de Psicanálise de Campinas
Movimento Psicanalítico Cuiabano – MT
Associação Psicanalítica de Porto Alegre
Recorte de Psicanálise – Porto Alegre
EPA – Espaço Psicanalítico
Núcleo de Estudos Sigmund Freud – RS
Associação Psicanalítica de Nova Friburgo
Colégio de Psicanálise da Bahia
Tempo Freudiano – Associação Psicanalítica

Depressão ou Melancolia?

Freud em seu artigo “O mal estar na civilização” convoca os psicanalistas a se ocuparem do mal estar do homem no mundo civilizado e a se interessarem pela subjetividade contemporânea. Isso porque a psicanálise está interessada na causa da insatisfação e da angústia do sujeito com o mundo dos objetos. Essa insatisfação já havia sido notada por Freud desde então, pois sua experiência clínica o levou a pensar a tensão nas relações entre sujeito e sociedade e nas formações sociais construídas como respostas ao conflito, que acabava por acarretar mais sofrimento do que seu enfrentamento. O que muda hoje é a realidade em que esse sujeito vive; estamos face à dialética entre subjetividade e sociedade na linha do tempo das relações sociais. Ao estudar as modalidades do sofrimento psíquico, os sintomas, compreende-se a sociedade da qual os sujeitos fazem parte, ao mesmo tempo em que ao estudar a sociedade e suas formações compreende-se as modalidades de sofrimento psíquico presentes na história de vida dos homens, num determinado tempo histórico.

Segundo Roudinesco, “o sujeito freudiano é um sujeito livre, dotado de razão, mas cuja razão vacila no interior de si mesma. É de sua fala e de seus atos, e não de sua consciência alienada, que pode surgir o horizonte de sua própria cura Assim,  a psicanálise é única, pois instaura o primado de um sujeito habitado pela consciência de seu próprio inconsciente, ou ainda pela consciência de seu próprio desapossamento. Em outras palavras, o sujeito freudiano só é possível por pensar na existência de seu inconsciente, no que é próprio de seu inconsciente. Do mesmo modo, só é livre porque concorda em aceitar o desafio dessa liberdade restritiva e porque reconstrói sua significação.”

A melancolia recebeu a atenção de Freud desde a pré-história da psicanálise. No Rascunho A, escrito em 1895, Freud inclui entre suas teses duas indicações sobre a depressão, e a apresenta como uma forma de neurose de angústia. No Rascunho B de 1983 ele retoma essa tese, porém passa a diferenciar a depressão periódica branca da melancolia propriamente dita. Isso porque, para Freud, a depressão teria uma ligação racional com um trauma psíquico, onde este funcionaria como a causa provocadora, ou seja, o fator desencadeante.

E é no Rascunho G (1895) que Freud utiliza as nomenclaturas de Kraepelin para falar sobre a melancolia. Neste rascunho a melancolia refere-se a estados depressivos causados por perda ou desvio de uma excitação sexual psíquica, ou seja, a melancolia seria um luto pela perda da libido. Freud escreve que a melhor descrição seria que a melancolia é uma inibição psíquica com empobrecimento pulsional e dor a respeito dele. Mas Freud continuou seu estudo, e no Rascunho K identifica a melancolia como um sentimento de pequenez do ego.

Até este momento é possível perceber, na literatura freudiana, que ele identifica a existência da melancolia e da depressão (neuroses), e de alguma forma tenta agrupá-las na mesma categoria clínica, já que eram tratadas da mesma forma. Após o Rascunho K, não se encontram mais textos oficiais que se refiram ao termo depressão, porém o estudo com o nome de melancolia prossegue, incluindo nesta nomenclatura também a noção de depressão. Foi então com os estudos de Freud de 1912, que ligavam a doença com as questões voltadas à libido, que as atenções para a depressão foram novamente ressaltadas.

Em seu trabalho Luto e Melancolia, Freud tentou abordar de forma mais específica um dos sofrimentos do sujeito nas suas relações objetais, pois para ele esse sofrimento, (que na época nomeou de melancolia), lhe parecia enigmática, por não ser possível ver sua causa, e também pelo fato de absorver o sujeito internamente de forma tão completa. Segundo Freud, esse sentimento seria de tamanha força, capaz de gerar no sujeito melancólico o empobrecimento do seu ego. Na melancolia, o ego fica vazio de significado e sentido. O ego melancólico fica desvalorizado, e por isso o sujeito acredita que merece ser punido e repreendido, pois não vê valor em si mesmo.

A melancolia aparece como um momento penoso, no qual o sujeito perde o interesse pelo mundo, por toda e qualquer atividade, e até por si mesmo. Esse desinteresse gera uma diminuição da auto-estima do sujeito, e este tenta de toda forma se punir pelo sofrimento que está passando. Ainda segundo Freud (1912), a melancolia seria um estado complexo exatamente porque sua relação com o objeto não é simples, e sim ambivalente. É como se o amor e o ódio estivessem em guerra, e essa luta estaria acontecendo dentro do próprio ego do sujeito. Assim, o ego sucumbiria ao complexo e se enfureceria contra si mesmo, de tal forma que para o sujeito só fosse possível ver uma solução: a autopunição e o esvaziamento de si mesmo.

Depois de Freud, muitos trataram da depressão. Fenichel, por exemplo, diz que os sujeitos melancólicos possuem um superego severo, pois se sentem culpados da agressividade demonstrada para com seu objeto amado. Os sujeitos melancólicos se sentem como objetos amados perdidos, embora não assumam todas as características do objeto. O ego é sentido como objeto mau e eventualmente esse objeto interno mau ou o objeto amado perdido é transformado em superego sádico. O ego passa, então, a ser uma vítima do superego, desamparado e sem poder.

Já Winnicot acredita que a depressão é nada mais do que um ódio reprimido e desejos de morte, que levam à inibição dos impulsos instintivos. É um sentimento de culpa por algo que funciona de forma antecipada, se voltando contra o sujeito.

Para o psicanalista Fedida, a depressão é uma forma de adoecimento, uma perturbação típica da afetividade humana que pode estar presente em todos os quadros de adoecimento. Diferenciando os estados depressivos da melancolia, Fedida diz que “o estado de imobilização e cristalização (da depressão) aparece com freqüência como última defesa vital contra o desabamento melancólico e a hemorragia da culpabilidade e da vergonha. Já a depressão é a doença própria a um afeto congelando a vida humana, por meio de todos os quadros clínicos, sendo que na depressão vital o sujeito não mais dispõe de sua capacidade de ressonância. Isso porque a ressonância originária, aquilo mesmo que o humanizou, é o que se encontra em estado de falta no deprimido: ele realizou um movimento de fechamento a sentir os menores movimentos da vida. Desapareceram desejos e devaneios e, por isso, o aniquilamento: quase nem chega a ser um afeto que se experimenta e parece muito distante da percepção de um sofrimento vivido pelo sujeito. O pensamento, a ação e a linguagem parecem ter sido totalmente dominados por uma violência do vazio”.

Na obra lacaniana, são raras as passagens em que o psicanalista faz referências diretas ao tema, pois ao invés de utilizar o termo depressão, utiliza a chamada dor de existir. Em resumo, Lacan trata essa dor como conseqüência do existir no império da linguagem, ao qual todo ser humano está destinado, e que emerge quando o desejo se retrai e avança o gozo da pulsão de morte. Segundo Laurent, existe uma teoria de melancolia do ensino de Lacan, que evolui durante toda sua obra. Para ele, Lacan pensava a melancolia como um sacrifício suicida: O sujeito melancólico se nomeia, ao mesmo tempo em que se eterniza, e com isto Lacan deixa de pensar a melancolia a partir do narcisismo, para pensá-la a partir dos efeitos do parasitismo da linguagem no sujeito, estando o sacrifício narcisista subordinado ao sacrifício simbólico.

Ao falar de narcisismo e objeto, Lacan amplia sua teorização, considerando que o sujeito melancólico, atravessado pela imagem que efetuaria no impulso suicida, poderia ser apresentado com um exemplo do impulso de se reunir com o próprio ser. Ou seja, na melancolia, através do ato suicida, o sujeito se encontra com o objeto a.

Mais tarde, em Televisão, Lacan retoma Freud e Platão para falar da depressão como uma paixão da alma, a dor de existir. Em seu último estudo, ele vai dizer que a nominação é problemática. Mas por quê? “Porque a nominação é uma suposição. É a suposição do acordo do simbólico e do real. É a suposição que o simbólico concorda com o real, e portanto que o real está em acordo com o simbólico”. Se não consideramos este acordo “então é preciso um ato. Este ato não pode ressaltar senão o ponto de estofo maior que é o Nome do Pai”. Por esta razão, Lacan vai dizer “o pai do nome, o pai nomeador, aquele que assume o ato da nominação, e por isso mesmo que liga o simbólico e o real”

Citando Lacan, que diz que a depressão é uma covardia moral, Berenguer considera a depressão como uma má leitura do impossível que está em jogo. Tornar a situar o sujeito diante de um trabalho para uma solução que leve em conta os seus verdadeiros recursos, não os do ideal, que são semblantes, pode ter por si só um efeito terapêutico.

Para tentar dar algum direcionamento a pergunta inicial deste texto, cito Marcio Peter, que nos lembra a psicanálise, não como um materialismo do significante, e sim como uma Ética. E o que isso significa? Que a experiência analítica não se trata só de estruturas, e sim de escolhas subjetivas. E essa deve ser nossa posição no tratamento da depressão/melancolia. É deixar “a coisa” falar, e inventar um saber do que não se pode dizer, definir.

Feminilidade e Maternidade

Muitas mulheres buscam na maternidade e no casamento a compensação de sua falta. Porém, o casamento envolve um outro sujeito que também convive com sua falta, e está relação estará sujeita a todas as questões de sexualidade que falarei em outro texto. Já a maternidade soluciona, mesmo que temporariamente, a falta do falo da mulher. A mãe tenta compensar sua falta-a-ser na criança. Esse é um recurso específico da mulher para compensar sua perda de gozo: ela pode gerar filhos.

Para Zalcberg, um filho desperta na mulher não só o sentimento materno, mas também desperta a mulher em falta, já que este simboliza o gozo perdido. A mãe vê na criança a oportunidade de se recuperar de sua própria falta. Porém esta situação dura um tempo determinado, já que a criança será seu falo somente até certo momento da vida. Assim, a mãe também é esta sempre fazendo o luto da perda da criança como seu objeto.

Ainda no começo da vida do bebe, a mãe transfere para ele todos os sentimentos vindos de sua própria vida sexual. O modo como acaricia e amamenta, por exemplo, mostram como a criança se torna o substituto do objeto sexual para a mãe. Freud não só enfatiza essa questão, como menciona que isso é necessário para o desenvolvimento da criança. No entanto Soler complementa que, ainda sim a mulher não resolve inteiramente seu problema fálico, pois logo percebe que o bebe não pode ser seu falo, e logo deve ajudar seu própria filha a lidar com a sua própria falta. Faz-se, então, importante abordar a relação mãe-filha um pouco mais de perto.

Quando a mãe descobre que seu bebê será uma menina, suas fantasias inconscientes automaticamente são transferidas para a filha, seja por sensações ou por memória corporal. É importante lembrar que, a mãe desta menina já foi filha, assim como a avó desta menina também já foi filha, ou seja, as mulheres transmitem, de geração para geração suas experiências, fantasias e expectativas.

Na menina que nasce a mãe vê o recomeço de sua própria vida e também o início da vida de sua filha como uma possibilidade de reparar e mudar tudo que as relações mãe-filha anteriores não conseguiram. Nessa perspectiva da mãe como mulher, o nascimento de uma filha pode despertar nela questões sobre a própria falta, que foram um dia evitadas, reavivando questões aparentemente superadas ou apenas adormecidas em uma mãe.

Zalcberg também diz que, se por um lado o nascimento de uma filha pode promover o despertar da feminilidade por meio de certo preenchimento, ao considerar a criança como seu falo, por outro lado a mãe pode ver na filha a perda de seu espaço de constituição de sua sexualidade e feminilidade. A semelhança do corpo feminino de mãe e filha, além da proximidade entre elas favorece uma identificação de ambas pela dependência que as conecta, em busca de entender e completar a falta-a-ser de cada uma. Assim, muitas vezes elas se tornam prisioneiras da própria relação, pois não vêem outra saída para ser mulher além do ser mãe e filha.

Essa relação que ocorre entre mãe e filha pode prejudicar a constituição de suas próprias imagens e sexualidades. Por um lado, a menina se vira para mãe em busca de carinho e de uma imagem sobre seu corpo, para que tenha a confirmação de que aquele corpo realmente a pertence. Depois, ela busca na mãe que esta reconheça seu corpo como feminino, também marcado pela falta. Nesse caminho logo surge a dúvida sobre sua identidade sexual – não identifica se é menina ou mulher. Por outro lado, muitas mulheres ao alcançar a condição de mãe se vêem confrontadas a escolher entre ser mãe ou ser mulher, como se fosse impossível conciliar ambas as tarefas.

Considerando o ser mãe e o ser filha como um dos pontos importantes para a constituição da feminilidade e sexualidade, podemos falar um pouco sobre alguns tipos de mães e filhas e suas implicações para o entendimento do universo feminino.

1. Mais mãe que mulheres

Para as autoras Eliacheff & Heinich, quando um bebê nasce, algumas mulheres se transformam e ficam completamente absorvidas pela maternidade, deixando de lado a própria identidade e o lugar de esposa, chegando por vezes a trocar a sexualidade conjugal pela sexualidade maternal. Elas se aniquilam nessa relação, e trocam as exigências maritais pelas exigências do filho. Essa situação pode chegar a um extremo, no qual o desejo de simbiose pode criar um vazio em torna da relação entre mãe e bebê, e todos os outros vínculos perdem lugar. Esse extremo apego, na qual a mãe dá ao filho todo a lugar em seu gozo, cria uma relação de dependência muito extrema, da mãe para com o filho.

Nos primeiros meses de vida os bebês exigem grande atenção da mãe nos cuidados, na amamentação, enfim, em muitos momentos. Porém a mãe não pode se utilizar dessa exigência para dedicar-se exclusivamente ao bebê, e muito menos deslocar as sensações eróticas que deveria buscar no marido, para o bebê.

Quando essa relação de dependência continua após o crescimento da menina, a mãe, ao se dedicar totalmente ao seu bebê, na verdade busca através desta a si mesma e a realização de seus próprios sonhos. Por vezes abandona o marido e rejeita os homens, pois coloca a filha na posição destes. Protegida pelas virtudes da maternidade, a mãe pode, sem vergonha, utilizar a criança para projetar nela suas próprias fantasias de sucesso.

Porém,  conforme a menina vai crescendo, e se tornando adolescente, a mãe percebe e teme ser excluída da vida de sua filha. Assim, tenta adiar esse momento excluindo a filha do mundo externo e controlando-a o tempo todo. A filha por sua vez, também teme esse momento pois percebe que terá que viver sua própria história, fazer suas próprias escolhas, e teme não conseguir sem a mãe uma vez que nunca se viu sem ela.

Quando a adolescente começa a viver seus momentos longe da mãe, esta pouco a pouco vai sentindo a ausência da filha e se vê novamente em contato com seu vazio. Por isso pode usar de diversas artimanhas para voltar a atenção da filha novamente para ela. A filha, por sua vez, por medo e por culpa pode renunciar a própria vida, a liberdade, para ficar e continuar esse laço com a mãe. Enquanto uma quer seguir adiante, a outra quer voltar, porém a mãe tem a seu favor a norma social que encoraja as mães a serem verdadeiras mães, totalmente mães de modo que a filha tem contra si o peso desta norma.

Já na fase adulta, quando essa relação se prolonga, muitas vezes o que se vê é um casal formado por uma velha mãe que não quer que sua filha cresça, e uma velha filha que não consegue se furtar a dominação da mãe. Eliacheff & Heinich dizem que a filha, porém, nunca conseguira satisfazer sua mãe, já que ocupa o lugar de um vazio que nunca deixará de existir. A mãe está sempre pedindo mais da filha, de modo que essa relação nunca chega a um ápice. Ambas se iludem que ao excluir um terceiro podem tornar-se uma só, e assim encontrar o caminho para a feminilidade. Uma se espelha na outra, e se confundem, já que não sabem os limites de identidade entre elas. As duas se tornam tão dependentes umas das outras que já não conseguem se desligar e fazer o corte necessário para que cada uma encontre seu próprio caminho.

2. Mais mulheres do que mães

Diferentemente das mulheres que optam por ser apenas mães, há aquelas que decidem tornarem-se mais mulheres, como forma de buscar sua feminilidade. Eliacheff & Heinich acreditam que existe também a mulher que só vive sua feminilidade na vivencia de uma paixão. Desta forma, não consegue amar e ser mãe para sua filha pois está mais ocupada em viver sempre apaixonada por um homem, seja este qual for.

Ainda considerando esse tipo de mulher que, embora mãe, não busca a maternidade como caminho para a feminilidade, há a mãe-estrela. Segundo Eliacheff & Heinich, as mães estrelas não conseguem ter outra paixão além de sua própria profissão. Nesse caso, uma filha para continuar se relacionando com esse tipo de mãe pode adotar uma postura de inferioridade, pois sabe que para estar ali precisa ser menos do que a mãe. Outra conseqüência de uma vivência com esta mãe, é que ela pode não aprender como se relacionar com o masculino, já que nunca teve o exemplo vindo da mãe.

É preciso destacar que exageros, não importa para qual lado, nunca são bem vindos nessa relação. De outro lado, parece importante ressaltar que não existem mães boas ou más. Existem mães complicadoras ou facilitadoras para suas filhas, ou que tornam o vinculo torto para produzir filhas difíceis, sufocadas pela ausência ou excesso de espaço entre elas. O importante, nessa relação seria lembrar a necessidade de um terceiro, e em que lugar este é colocado na relação de mãe e filha, numa espécie de equilíbrio.

Desta forma, podemos entender porque Lacan faz da figura do pai algo tão importante em sua teoria, quando se discute qualquer relação. É esse terceiro que exercerá o papel da lei, e que poderá efetuar corte, fazer barreira e deste modo constituir sujeito. Até porque essas separações em estruturas e papéis que fazemos para efeito de estudo não são tão simples e quadradas quanto parecerem, ainda que algumas teorias insistam que esse enquadramento seja possível.

(Continua)

Para ler mais

Mães-filhas: Uma relação a três – Eliacheff & Heinich

A relação mãe e filha

Feminilidade e Sexualidade – O corpo

Na busca de uma resposta para a falta de significante especifico de seu próprio sexo, a menina busca também respostas no seu corpo e na forma como vive sua sexualidade. Após Freud, outros autores como Melanie Klein adicionaram outras problemáticas pertinentes a realidade feminina. Para ela, é importante a forma como a menina representa seu genital, pois isso pode afetar a forma como ela lida com sua sexualidade e feminilidade.

De acordo com Klein, a primeira dificuldade para a menina seria de reconhecer seu genital, entende-lo e aceitar sua condição. Bernstein, por sua vez, propõe três termos para melhor entendermos essa fase da menina. O primeiro deles é o acesso, momento em que a menina percebe que não tem acesso aos próprios genitais, não pode vê-los da mesma forma que o menino, e por isso cria uma dificuldade de representação mental das partes de seu próprio corpo, principalmente em um lugar que gera sensações intensas. A falta de familiarização com seu genital torna-o alvo de fantasias proibidas ou sentimentos culposos, gerando angustia consigo mesma e sua sexualidade. Esse segundo momento denomina-se difusão.

O terceiro ponto seria a penetração. O formato da vagina, aberto, e cujo fechamento não há controle coloca a menina numa insegurança contra a sua proteção. Fantasiam sobre seu buraco e se sentem vazias, inertes. Não conhecem a origem de suas sensações e por vezes se incomodam com as mesmas, quando eventualmente ocorrem. Para a menina é como se ela tivesse um buraco aberto através do qual coisas podem sair e entrar, e que não há como abrir ou fechar, nem controlar o acesso. Assim, a menina sente como se estivesse sempre em perigo de penetração, e teme se machucadas pelo que pode entrar. Além disso, a autora complementa que, a questão de proximidade da vagina com o anus pode deixar a sensação, na menina, que sua vagina é suja.

Essa variedade de angústias, segundo Bernstein, é central no processo de definição da sexualidade e feminilidade na menina. Porém, segundo Mcdougall, um caminho possível para neutralizar essas angústias e buscas seria a menina deixar de querer ter para poder ser, ou seja, sua falta do pênis se transformaria em um desejo pelo pênis. Outra solução poderia ser a maternidade, e assim por diante.

Eu acho toda essa teoria inglesa muito interessante, mas não concordo com ela. Acredito que ela é muito apegada a concretude da “inveja do pênis”. Lacan criticava muito a escola inglesa mais ou menos nesse caminho.

No Seminário 20, Lacan fala muito sobre feminilidade. Ele trata de gozo e demanda de amor, e quando fala de sexualidade feminina diz que esse sexo fálico masculino não diz nada para a mulher, porque ela não é toda (não tem o falo). Portanto o sexo só poderá lhe dizer alguma coisa através do gozo do corpo. Para Lacan, nada distingue a mulher como ser sexuado, a não ser pelo sexo. O gozo fálico seria o grande obstáculo do homem para entender a mulher, porque são gozos distintos. Então podemos pensar que tratar a feminilidade a partir da idéia fálica de inveja do pênis seria limitar e simplificar demais a questão.

(Continua…)

Para saber mais:

– J.Lacan – Seminario Mais, Ainda

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