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Like A Star Corinne Bailey Rae

Just like a star across my sky,
Just like an angel off the page,
You have appeared to my life,
Feel like I’ll never be the same,
Just like a song in my heart,
Just like oil on my hands,
Honour to love you
Still I wonder why it is,
I don’t argue like this,
With anyone but you,
We do it all the time,
Blowing out my mind,

You’ve got this look I can’t describe,
You make me feel like I’m alive,
When everything else is au fait,
Without a doubt you’re on my side,
Heaven has been away too long,
Can’t find the words to write this song,
Oh…Your love,
Still I wonder why it is,
I don’t argue like this,
With anyone but you,
We do it all the time,
Blowing out my mind,

Now I have come to understand,
The way it is,
It’s not a secret anymore,’cause we’ve been through that before,
From tonight I know that you’re the only one,
I’ve been confused and in the dark,
Now I understand,
I wonder why it is,
I don’t argue like this,
With anyone but you,I wonder why it is,
I wont let my guard down,
For anyone but you
We do it all the time,
Blowing out my mind,
Just like a star across my sky,
Just like an angel off the page,
You have appeared to my life,
Feel like I’ll never be the same,
Just like a song in my heart,
Just like oil on my hands

Percepções

Ao longo da vida nós fazemos escolhas, e essas escolhas nos marcam como sujeitos. Pois é. Todas as escolhas nos marcam. Desde o momento que você acorda e decide por exemplo tomar leite, e não café, até aquele momento no trânsito que você decide deixar alguem entrar na sua frente ou nao, e também outro momentos no qual você decide entrar num site pornográfico ou não. O fato é que todas as escolhas nos marcam como sujeitos. Todas elas vão dizendo, ao longo do tempo, quem somos, o que gostamos, o que não gostamos, o que fazemos quando estamos felizes, o que fazemos quando estamos triste, e o que fazemos quando ficamos sozinhos entre quatro paredes.

 

Entre quatro paredes a gente chega a pensar que ninguém pode saber o que a gente faz. Ou mesmo o que a gente pensa. Mas é ai que nos enganamos. Porque, sem querer, escapam coisas que não percebmos e que dizem desses momentos que achamos que podiamos esconder do mundo (e talvez de nós mesmos): os sonhos que contamos aos nossos amigos, sem saber o que estamos contando; os lapsos de memória em uma conversa; os tipos de filmes que gostamos de assitir; as brincadeiras e piadas que contamos e fazemos; o que deixamos de falar em determinadas dicussões; o ciumes fora de hora; a distância que tomamos de pessoas queridas, e a aproximação que fazemos de estranhos; whatever, tudo fala de quem somos e pra onde vamos.

 

A verdade é que ninguem fica reparando nisso o tempo todo. Ninguém fica fazendo analise do discurso 24/7. Isso, além de ser cansativo, não é natural do ser humano. Mas o fato é que algumas coisas são gritantes, parece que estão ali para ser vistas, escutadas, notadas. E a gente simplesmente nota.

 

O que se faz disso? Well, muita coisa. São os vários tipos de relacionamentos que as pessoas fazem ao longo da vida. Aprendemos a nos relacionar com as pessoas, de diferentes formas, e aprendemos a fazer ou não alguma coisa do que notamos. Bom, algumas pessoas não notam nada, preferem não desenvolver tal habilidade para não ter que lidar com as consequencias e decisões que tem que tomar quando as tem.

 

Eu, por mim? Noto sim, é verdade. Por vezes noto mais do que gostaria. Mas, na maior parte do tempo finjo que não. Esse é talvez a maior dificuldade mas também a maior virtude que posso desenvolver: deixar que cada um dê conta de si mesmo, mesmo notando tudo que noto.

Perfume: The story of a murderer

Perfume: the story of a murderer é um filme fantástico. A história é fantástica. O cara é um psicótico, mas tem uma lógica própria de funcionar e entender o mundo. E mostra como tem importância sim o momento do nascimento e os primeiros anos de vida.

 

Ele nasceu no meio dos peixes, na sujeira, na imundice. E cheiro de peixe a gente sabe bem o quanto horrivel é, imagina num lugar que já não é nada limpo. E não é que ele cresce tentando descobrir a essencia das coisas? É um duplo sentido, pois ele quer sentir a essência, o cheiro das coisas (e não do peixe), e quer descobrir aquilo que ele sente que não tem, a essencia de si mesmo.

 

Obcecado pelos cheiros, e com uma facilidade imensa de distinguir uma essencia da outra, finalmente tem contato com aquilo que é belo, bonito, uma essência bonita. E na sua ansia de manter aquilo nele, mata a primeira coisa que poderia dispertar nele algo de bom. O primeiro cheiro que talvez o fizesse valorizar a vida e esquecer o (maldito) cheiro de peixe, cheiro do desprezo. E a linha tênue entre vida e morte então, pra ele não existe, já que pra ele viver foi simplesmente algo que aconteceu ao acaso, sua vida não foi desejada. Tão próximo da morte, ele entende que deve ser nesse ultimo momento que a essencia de uma pessoa pode ser preservada pra sempre. E é quando percebe que ele mesmo não tem cheiro, ele mesmo não tem essência, ele já está morto. Passa então a buscar loucamente uma essencia primeira, aquela que seria capaz de devolver-lhe a vida, de colocar-lhe numa posição desejavel, e pela primeira vez ser desejado por alguem. Mas ele não percebe que quer ser desejado e visto como sujeito pelas essencias que ele não tem, são as essencias de outros!!! E, de fato esse dia chega, o dia em que ele capta essa essencia capaz de tornar uma pessoa desejavel, sujeito, alguem, tudo que ele nunca foi. Mas, qual é sua surpresa, pois, depois que ele se dá conta que chegou onde queria, ele continua se sentindo o mesmo. Ele continua sendo visto por todos da mesma forma como sua mãe o viu, como alguém desprezivel. Ele ainda não é ninguem, ele ainda não se encontrou, porque afinal, estava procurando no lugar errado.

 

O impressionante desse filme, além da história em si, é ver como funciona a mente dele. Nada é obstáculo para o seu objetivo, e ele não vê a morte como algo horrivel, primeiro porque ele já se sente morto-vivo, segundo porque a pessoa-copro morria, mas sua essencia era preservada viva.

 

E porque estou falando de tudo isso hoje? Porque a gente passa a vida procurando essa essencia de nós mesmos. E é uma busca que não tem fim, e é necessária porque é assim que nos conhecemos. Mas a verdade é que esse caminho é infinito. Não chega um dia no qual encontramos de fato a verdade absoluta de nós mesmos. Porque isso não existe! Essa verdade é inconstante, está sempre em movimento. Hoje está em ir ao cinema, amanha está em trabalhar, depois está em ser mãe, e mais a frente estará em outra coisa qualquer. E as pessoas deprimem muito hoje em dia porque, ao perceber a impossibilidade de encontrar-nos a nos mesmos de forma absoluta, ficamos presos, estagnados, sem conseguir nos mexer. E ficamos nos sentido como estátuas, presos numa impossibilidade, e sem ser capaz de criar outros caminhos para o futuro. E enquanto isso assistimos a vida passar, e assim o sofrimento só aumenta. Ou chega a tal ponto de anestasiar, e não sentimos mais nada em relação a nada. Que perigo!!!

 

Estar sempre em movimento, esse é o segredo, e talvez essa seja algo mais próximo da verdade absoluta. O nosso desejo tem que estar sempre em movimento, sempre atrás de possibilidades de realização. Assim não nos fixamos nas impossibilidades e podemos ser criativos e livres para sermos sujeitos de nós mesmos.

Thinking

Outro dia estava passando na TV, de novo, Vanila Sky. E de novo eu não consigo não ver. Este, e Brilho Eterno de uma mente sem lembranças são filmes que capturam minha atenção. Tenhos os dois, mas se vejo passando na tv, não consigo não ver. Por que? É impressionante a tentativa do ser humano em não ter que dar conta de suas feridas narcisicas. Primeiro a gente tenta inventar um SuperHomem, alguém que não morre, e ainda por cima é capaz de salvar todo mundo. O sonho de todo ser humano. Mas ele não faria tanto sucesso se não se parecesse de fato com um ser humano, então para isso ele tem uma fraqueza. E é exatamente essa fraqueza que o aproxima tanto de nós. Passada a fase super-héroi, começamos a tentar inventar máquinas ou coisas que nos permitisse viver a vida do jeito que gostaríamos que ela fosse, sem coisas ruins. E é ai que entram os dois filmes. Que maravilha seria, ao ter um problema, você simplesmente se congelar, e assim poder sonhar o sonho mais perfeito pra sempre. Mas vamos analisar de perto essa situação. Quando a gente tem um problema, a probabilidade de sermos responsaveis pela existencia dele é quase de cem por cento. Então o pior não é você ter o problema, mas você ter que admitir que você o tem porque você mesmo o causou. Então, o que as pessoas fazem? Culpam o mundo, culpam qualquer coisa, menos elas mesmas. Uma vez que o problema já existe, é muito dificil lidar com ele, então não é mais facil criar uma realidade paralela onde você não precisa pensar nem lidar com o problema? Você simplesmente se congela, e escolhe exatamente o que quer viver,e assim ser feliz pra sempre. Mas, não se esqueçam, somos seres humanos. E por mais que não entedemos nossa cabeça, ela funciona além dos nossos desejos! Então você está lá, vivendo essa realidade paralela, mas algo dá errado. Algo vem pra te mostrar que aquilo também não é perfeito como você gostaria. Algo vem te mostrar que mesmo os nossos desejos mais profundos também podem ser horriveis de ser vividos. O que me lembra do segundo filme. O ser humano não gosta de sofrer, mais o sofrimento é inerente a nossa evolução. É por sermos capazes de, frente a um sofrimento, aprender seguir adiante, que evoluimos. Somos capazes de olhar para trás, enxergar nossos erros, aprender com eles, e poder viver o futuro de uma maneira melhor. Mas imagine se realmente inventassem uma maquina que apaga memorias? Que absurdo! Bom, você não teria que lidar com a dor de uma separação, com as frustrações da vida, como o fato de que nem todo mundo gosta de você como você gostaria, mas, o que seriamos capazes de aprender com isso? Seriamos eternamente errantes. Repetiriamos sempre os mesmos erros e assim sofreriamos sempre. Seriamos escravos de uma máquina, e de nós mesmos, de nossos erros. Então, quando vejo esses filmes, não consigo não assisti-los, e por que? Porque ainda é impresssionante como eles remetem a nossa vida real, na qual desejamos e pesquisamos ferozmente pra que essas engenhocas existam, e o perigo de que um dia elas possam existir me assusta um pouco. Será que não vale a pena sofrer, mas ser capaz de lembrar também todas as coisas boas da vida? Será que não vale a pena ter problemas exatamente porque somos capazes de resolve-los e ficarmos extremamente contentes com o rumo que toma a nossa vida quando somos nós quem decidimos o que quereremos do futuro? Será que o ser humano prefere ser objeto de sua vida, e não sujeito? E o preço que se paga? O triste e olhar para tudo isso e perceber que, como ainda não temos essas máquinas, temos outras coisas que nos afatam de nós mesmos e da vida. A internet, os remedios, os vicios, enfim, muitas coisas que nós mesmos inventamos para criar nossas realidades paralelas. E enquanto nos afastamos da vida, outros assumem nossos lugares e tomam decisões malucas pelo mundo e pa sociedade, e ai a gente vive essa caos que vivemos. E ai achamos mais um motivo pra continuar na nossa realidade paralela, afinal, o mundo está um caos. É um ciclo vicioso, e o ser humano nunca se implica nisso. Nossos atos sempre tem consequencias, inclusive quando a gente se retira para o nosso mundinho. Como dispertar a vontade de viver nessa multidão de pessoas que vivem suas realidades paralelas? Como mostrar que viver vale a pena, sofrer também vale a pena, e ser sujeito da sua propria vida pode ser muito gratificante? É a metáfora do sapo, ele sai e vê que o mundo é lindo, mas como voltar e convencer o outro que não quer sair? Temos esse direito? Ou mais, esse é nosso dever? Então, para celebrar o quanto é bom viver, recomendo o filme (que ainda não sei o nome em Português) Scenes of a sexual nature. É um filme que celebra as pequenas coisas da vida, os pequenos momentos, as brigas, os desencontros, os encontros, as escolhas que fazemos, enfim, um pouco de tudo. Recomendo também Stranger than fiction que mostra como é possivel nos tornarmos sujeito de nossas vidas mesmo quando já parece tarde, e como isso pode ser gratificante!

Palhaços

Detesto palhaços. Ele te fazem sorrir a toa. Eles te fazem sorrir quando você não está a fim. Eles te fazem sorrir e esquecer do que é importante pra vida, que não é aquela esperança bobinha, e sim o fato de que a vida é dura sim e você tem que lutar, e que na maior parte do tempo você não irá sorrir. Não, você não passa a maior parte da vida sorrindo.

Desvairos

O tempo… Eu não acho as palavras.
Eu não moro mais em mim.

O tempo… Onde será que você está agora?
Estou ao meio.

O tempo… Passa e leva tudo embora.
Onde está o futuro?

O tempo…

Nostalgia II – (GG S07E14)

(From the OC)

You say life is a dream where we can’t say what we mean
Maybe just some roadside scene that we’re driving past
There’s no telling where we’ll be in a day or in a week
And there’s no promises of peace or of happiness
Well is this why you cling to every little thing
And polverize and derrange all your senses
Maybe life is a song but you’re scared to song along
Until the very ending
Oh, it’s time to let go of everything we used to know
Ideas that strengthen who we’ve been
It’s time to cut ties that won’t ever free our minds
From the chains and shackles that they’re in
Oh, tell me what good is saying that you’re free
In a dark and storming sea
You’re chained to your history, you’re surely sinking fast
You say that you know that the good Lord’s in control
He’s gonna bless and keep your tired and oh so restless soul
But at the end of the day when every price has been paid
You’re gonna rise and sit beside him on some old seat of gold
And won’t you tell me why you live like you’re afraid to die
You’ll die like you’re afraid to goOh, it’s time to let go of everything we used to know
Ideas that strengthen who we’ve been
It’s time to cut ties that won’t ever free our minds
From chains and shackles that they’re in
From the chains and shackles that they’re in
Well life is a dream ‘cause we’re all walking in our sleep
You could see us stand in lines like we’re dead upon our feet
And we build our house of cards and then we wait for it to fall
Always forget how strange it is just to be alive at all

Palavras

Tudo está dito
O fim está próximo

As palavras nos tocaram
Nos machucaram
Nos fizeram pensar no amanha
Amanha que não existirá para nós dois
Serei eu aqui, você longe

Tudo está dito
O fim está próximo
O que faremos então?

Palavras podem ser somente palavras
Mas as ações não perdoam
Fingimos não ver a verdade
E agora nos despedimos sem palavras

Me perdoe por pedir, suplicar, exigir
Mas ha coisas que não são ditas
E que não podem ser explicadas
Com palavras

Por isso acredito que
Tudo está dito
E o fim chegou
Adeus

Cada dia um momento

Cada dia um momento
Pra curtir
Pra viver
Pra escolher
Pra se arrepender

Cada noite uma hora
De tomar folego
De sonhar
De desejar
De se arrepender

Você procura, depois se esconde
Você chama meu nome, mas fica em silêncio
Você vê dois caminhos na sua vida
E esses caminhos se abrem em mais caminhos
E você quer todos eles
E eu também

Cada dia um momento
Pra curtir
Pra viver
Pra se arrepender
E pra se apaixonar

Cada noite uma hora
De tomar folego
De sonhar
De amar
De se arrepender

Você procura, depois se esconde
E chega a hora do julgamento
E a vida não é a justa
Ninguém vê o caminho que você andou
E você não sorri
Nem eu

Cada dia um momento
Cada noite uma hora
De se arrepender

Mas se quer você tentar
Eu acredito

O tempo que passa e o tempo que não passa

Na psicanálise, tempo e memória só podem ser considerados no plural .

É muito comum pensar no tempo como tempo seqüencial, como categoria ordenadora que organiza os acontecimentos vividos numa direção com passado, presente e futuro, um tempo irreversível, a flecha do tempo, um tempo que passa. Também estamos acostumados a pensar na memória como um arquivo que guarda um número significativo de lembranças, semelhante a um sótão que aloca uma quantidade de objetos de outros momentos da vida, que lá ficam quietos, guardados, disponíveis para o momento no qual precisamos deles e queremos reencontrá-los. No entanto, a forma na qual a psicanálise pensa o tempo e a memória está muito distante desta maneira de concebê-los. Na psicanálise, tanto o tempo quanto a memória só podem ser considerados no plural. Há temporalidades diferentes funcionando nas instâncias psíquicas e a memória não existe de forma simples: é múltipla, registrada em diferentes variedades de signos.

 

Há um tempo que passa, marcando com a sua passagem a caducidade dos objetos e a finitude da vida. A ele Freud se refere no seu curto e belo texto de 1915, “A transitoriedade”, no qual relata um encontro acontecido dois anos antes, em agosto de 1913, em Dolomitas, na Itália, num passeio pelo campina na companhia de um poeta. Ambos dialogam sobre o efeito subjetivo que a caducidade do belo produz. Enquanto para o poeta a alegria pela beleza da natureza se vê obscurecida pela transitoriedade do belo, para Freud, ao contrário, a duração absoluta não é condição do valor e da significação para a vida subjetiva. O desejo de eternidade se impõe ao poeta, que se revolta contra o luto, sendo a antecipação da dor da perda o que obscurece o gozo. Freud, que está escrevendo este texto sob a influência da Primeira Guerra Mundial, insiste na importância de fazer o luto dos perdidos renunciando a eles, e na necessidade de retirar a libido que se investiu nos objetos para ligá-la em substitutos. São os objetos que passam e, às vezes, agarrar-se a eles nos protege do reconhecimento da própria finitude. Porém, a guerra e a sua destruição exigem o luto e nos confrontam com a transitoriedade da vida, o que permite reconhecer a passagem do tempo.

 

No entanto, no entender de Freud, a nossa atitude perante a morte não implica essa certeza. Se de um lado aceitamos que a morte é inevitável, quando se trata da própria morte tentamos matá-la com o silêncio, desmenti-la, reduzi-la de necessidade à contingência. “No inconsciente, cada um de nós está convicto de sua imortalidade”, afirma Freud, em De guerra e morte. Temas de atualidade. Nada do pulsional solicita a crença da própria morte. Esta só se constrói secundariamente, a partir da morte dos próximos, da dor e da culpa pela mesma. Nem a própria morte nem a passagem do tempo têm registro no inconsciente, afirma Freud.

 

O tempo do inconsciente não é um tempo que passa, é um “outro tempo”, o tempo da “mistura dos tempos”, o tempo do “só depois”, o “tempo da ressignificação”.

 

A forma na qual se constroem as lembranças nos mostra isso, assim o explicita Freud em um texto de 1899: “As lembranças encobridoras”, valendo-se de um exemplo que, embora não revele no texto, é uma lembrança dele mesmo que surge durante umas férias de sua adolescência. Quando Freud tinha 16 anos viajara para Freiberg, sua cidade natal, sendo este o primeiro retorno desde a sua infância. Nesta ocasião, vive uma paixão por Gisela, a primogênita da família que o hospeda. Trata-se de um momento no qual, para Freud, os projetos de futuro estão em jogo: a sobrevivência econômica e o amor. Nesse momento, surge nele uma lembrança infantil: três crianças, entre elas ele mesmo, brincam e colhem flores numa campina verde e coberta de flores amarelas. Formam ramos de flores e os meninos arrancam o que está nas mãos da menina por ser o mais lindo. Ela corre, chorando, até uma camponesa que lhe oferece, para seu consolo, um pedaço de pão. Eles vão também atrás de um pedaço de pão que a camponesa lhes entrega. Nesta lembrança dois detalhes se destacam: a força do amarelo das flores e o sabor do pão, tão acentuados que beiram à alucinação.

 

O retorno à cidade natal mobilizara em Freud as vivências da infância, reativando marcas mnêmicas, marcas sensoriais de detalhes aparentemente insignificantes – porém fundamentais – que são carregadas pelas lembranças e às quais estas devem a sua vivacidade. Marcas da erotização e também dos lutos, da ausência de objetos. Essas marcas se oferecem como pontos de contato com as fantasias posteriores que sobre elas se projetam, criando pontos de condensação. Assim, duas fantasias que tocam temas fundamentais da vida do jovem Freud – a fantasia amorosa com a moça da família que o hospeda e a fantasia sobre sua sobrevivência econômica – projetam-se sobre a lembrança infantil que lhe faz de tela. O amarelo do vestido que a moça vestia no primeiro encontro faz um ponto de condensação com as flores da infância, intensificando o amarelo das flores da lembrança. Da mesma maneira, a fantasia sobre a sua sobrevivência econômica, através da frase “ganhar o pão”, confere uma intensidade maior ao sabor do pão na lembrança. Fantasias, lembranças e pensamentos de épocas posteriores se enlaçam simbolicamente com as da infância, intensificando, deformando ou transformando a lembrança infantil. Estas lembranças são as lembranças encobridoras.

 

Mas não é um tipo especial de lembrança que nos interessa e sim a dinâmica psíquica que nela se põe em jogo e que pode ser estendida à construção das fantasias e ao funcionamento geral da realidade psíquica. Neste funcionamento, a memória não é única nem fixa, ao contrario, as lembranças vão sendo construídas num processo de retranscrição. Freud inaugura uma teoria da memória ao afirmar que o material das marcas mnêmicas reordena-se de tempos em tempos, formando novos nexos. Na constituição da lembrança há, portanto, uma mistura de tempos. Os tempos não mantêm uma cronologia, passado, presente e futuro se misturam, se confundem. A lembrança infantil é como um quadro. O espaço do enquadramento é dado pelo próprio texto da lembrança, no qual se combinam traços. Traços que revelam as marcas de erotização e também os processos de luto vividos que deixaram as marcas do objeto ausente. Ou seja, há um passado que se cria e se recria em novas articulações.

 

Ao assinalar a existência deste outro tempo que é o tempo da ressignificação, Freud distingue o funcionamento do inconsciente do da consciência e rompe com a idéia de uma causalidade linear, de um passado que determina um presente, afastando-se de um determinismo mecanicista. Não procuramos no passado a causa do presente. O que passou se fez realidade psíquica.

 

A historia de um sujeito não é, portanto, uma linha reta, mas é traçada por pontos de condensação nos quais as tramas do vivido se entrecruzam e pulsam, forçando a presença do passado no atual, resistindo a qualquer linearidade cronológica e construindo uma realidade psíquica que não coincide totalmente com a realidade material.

 

O tempo do après-coup é um conceito fundamental no arcabouço teórico freudiano. Há acontecimentos da infância que se inscrevem difusamente, marcas psíquicas que ficam informes, indefinidas, à espera de um acontecimento e que só depois adquirem sentido. Temos então a idéia de um passado que não é fixo, mas que se ressignifica no presente.

 

Nesse “outro tempo” que não respeita a cronologia, nesse tempo do só depois, há movimento – que retranscreve, que articula novos nexos, rearticula as inscrições do vivido – construindo sonhos no dormir, fantasias e pensamentos na vigília. Há movimento das dimensões pulsionais e desejantes que, misturando os tempos, produz novos sentidos. O tempo não passa no sentido do tempo seqüencial, em uma direção irreversível, mas, na mistura dos tempos, as marcas mnêmicas nas mãos do “processo primário” condensam-se, deslocam-se e criam novos sentidos.
Mas há também, no psiquismo, uma outra relação entre passado e presente na qual o après-coup parece não operar mais, a imobilidade impera, assim como “eterno retorno do mesmo”, como mera insistência pulsional, fazendo do passado um destino. “Neurose de destino”, dirá Freud. No funcionamento da compulsão de repetição, o pulsional mais puro, sem possibilidade de representação, se encarna no atual, se apossa dele como sombra vampiresca e, no fora da linguagem, perde-se qualquer possibilidade de fazer o luto, de transformar a perda em ausência. Nessa presença da pulsão pura, a expressão “o tempo não passa” ganha toda a sua força.

 

A diferenciação dos funcionamentos temporais no psiquismo está presente ao longo da obra de Freud, sendo um dos fios importantes da metapsicologia freudiana. As concepções de memória e causalidade psíquica subvertem a psicologia da consciência e são parâmetros básicos que fundamentam a clínica psicanalítica.(Silvia Leonor Alonso)

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